sexta-feira, 4 de março de 2011

Vaudeville

Publico aqui, o texto publicado originalmente no blog http://ricardostumpf.blogspot.com/ sobre o livro de memórias de Ricardo Amaral, símbolo máximo do arrivismo que imperou no Brasil durante a Ditadura Militar.


Vaudeville

O empresário da noite, Ricardo Amaral, lançou seu livro de memórias, onde conta suas peripécias como dono de boates da moda nos anos 60, 70 e 80. Sua esposa Gisela Amaral e ele deram muitas entrevistas à TVs e revistas, se vangloriando da vida que levavam.
Não tive estômago para ler seu livro e conferir se ele conta, entre os seus feitos notáveis, o fato de que provocou um acidente na rodovia Rio-São Paulo em 1973, quando sua Mercedes-benz atravessou a pista em alta velocidade e veio chocar-se de frente com um Volkswagen de um casal que voltava do seu sítio em Barra do Piraí, matando os dois.
Ricardo Amaral não teve seqüelas graves, enquanto Gisela quebrou uma perna. Mas para evitar escândalo, se aproveitando das suas boas relações com os governos da ditadura, Ricardo comprou a polícia da baixada fluminense para que o casal fosse rapidamente enterrado como indigente, antes que a imprensa soubesse do caso e pudesse causar algum prejuízo à sua imagem de empresário da alegria da noite carioca.
O dois mortos eram meus tios, Thomas Maracajá e sua esposa, irmã de minha mãe, Cyrene Stumpf Maracajá.
Quem impediu que o enterro acontecesse foi um agente funerário de Barra do Piraí que conhecia meu primo, filho deles, funcionário do Banco do Brasil na época, e o avisou. Meu primo localizou os corpos dos pais, nus, sobre uma pedra, no necrotério de uma cidade da baixada, prontos para serem enterrados e esquecidos.
Resgatou-os, deu a eles um enterro decente e conseguiu condenar Ricardo Amaral a dois anos de cadeia, pena que ele não cumpriu pelo benefício da Sursis, uma figura jurídica que permite manter em liberdade quem é condenado até dois anos no máximo. É claro que ele conseguiu o benefício devido às suas boas relações com as autoridades militares da época.
Duro é vê-lo ainda hoje sendo tratado como herói pela imprensa, continuando com sua vida boa, seu vaudeville, enquanto nossa família teve que se contentar em ficar sem Maracajá e Cirene, duas figuras lindas, sem ver a justiça ser feita.

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