Há alguns meses, a mídia repercutiu com grande estardalhaço as denúncias de trabalho escravo na produção têxtil, com destaque para a rede espanhola Zara.
A empresa pediu desculpas aos brasileiros, assumiu compromissos junto ao Ministério do Trabalho, foi ao Congresso e tem lutado para recompor sua imagem.
Mas além do caso Zara, subsiste a superexploração do trabalho na cadeia produtiva da moda.
E mais grave, é praticada à vista de todos, sem que ninguém proteste ou sequer denuncie.
Digo isso pensando nos trabalhadores do comércio, que nos finais de ano são submetidos a jornadas de trabalho que frequentemente superam 90 horas semanais, trabalhando de domingo a domingo sem folgas no mês de dezembro.
São cerca de 8 milhões de brasileiros que vivem sob um inferno de assédio moral, jornadas infindáveis, quase sempre abrindo mão do direito ao horário e subsídio de alimentação.
Esta nova modalidade de trabalho escravo não acontece nos grotões ou em fazendas pelo interior do país, longe dos olhares e das consciências da classe média, mas sim em todas as capitais e maiores cidades do Brasil.
Soma-se à jornada inconstitucional, o estímulo à fraude de documentos com a assinatura de folgas inexistentes, ou recebimentos de horas-extras não pagas.
A extensão do horário de atendimento do comércio, nessa época do ano, não significa melhoria no atendimento e sim uma intensificação cruel do trabalho dos comerciários.
Este estado de coisas conta com a complacência dos sindicatos de comerciários que concordam com as regras de funcionamento nos finais de ano e com a miopia da fiscalização do Ministério do Trabalho.
Não existem outras justificativas.
Tudo isso aceito tacitamente pelos trabalhadores, que sutilmente vão sendo convencidos a abrir mão de seus direitos, graças às ameças de perda do emprego.
Oras, não há meio direito, assim como não há meia gravidez.
Aqui em Brasília, a pouco mais de 2700 metros da sede do Ministério, existe um grande centro comercial, onde os "escravos" do comércio cumprem sua sina sem apoio ou atenção do poder público.
O comércio representa uma das faces mais cruéis do capitalismo, por um lado estimulam e vivem do consumismo desesperado que drena o planeta, endivida famílias e esvazia mentes e artificializa necessidades. Em suma: consagra a futilidade. Por outro, submetem seus trabalhadores a condições de trabalho do século retrasado.
Isso com uma roupagem de "espírito natalino".
O Natal, cujo personagem principal deixou de ser Jesus para se transformar no feriado dedicado a Noel, é palco cada vez mais de um festim diabólico que conjuga consumismo insano com a cassação de direitos elementares para milhões de brasileiros.
Nenhum comentário:
Postar um comentário